terça-feira, 16 de novembro de 2010

Mãe mata filho e diz que foi por engano / Erro de tipo? (art. 20 do CP)

Um crime e duas versões. Maria Liduina de Freitas da Silva, 52, mora no Xié, em Itamaracá, e ganha a vida como vendedora de frutas no Recife. Teve quatro filhos. Na noite do último domingo, matou um deles. Ela se entregou à polícia. Contou que dormia quando Clebson Freitas Pereira, 30, arrombou a porta de casa. Disse que viu um vulto. E que esfaqueou o filho acreditando que era um ladrão. Mas não é isso o que a vizinhança conta.

Na rua onde a família morava, quem viu a confusão retrata Maria Liduina como uma mulher fria, que sabia exatamente quem estava esfaqueando. Clebson foi socorrido pelo Samu, mas morreu no Hospital Miguel Arraes, em Paulista. Foi enterrado ontem, em Itamaracá, sob os olhos da mãe.

O delegado responsável pelas primeiras diligências, Francisco Diógenes, disse que domingo foi o aniversário de Clebson e que o rapaz teria bebido e chegado agressivo em casa, quebrando a porta e dando socos na parede. De acordo com ele, a mãe da vítima contou que dormia quando a nora foi à cozinha e viu que a casa havia sido arrombada. Liduina, segundo essa versão, levantou e pegou uma faca. Ela só teria percebido que esfaqueou o filho depois, quando ele a chamou de mãe. A apresentação espontânea a livrou do flagrante. O delegado entendeu que houve homicídio culposo (sem intenção) e a liberou.

No velório, mostrou a identidade do filho. A data de nascimento: 10 de janeiro de 1980. Começam as contradições.

Vizinhos que pediram para não ser identificados contaram que na noite do domingo, Maria Liduina, Clebson, seu padrasto e sua companheira, grávida de oito meses de um bebê que não é dele, estavam no quintal. Clebson morava com a companheira, com quem estava há seis meses, numa casa de taipa. A mãe e seu marido residiam em outro imóvel, aos fundos. Liduina, Clebson e o padrasto bebiam. Por volta das 22h30, apesar da música alta, os vizinhos ouviram gritos de uma discussão. Naquele momento, a mãe e o padrasto de Clebson estavam na casa dos fundos.

´Eu não vi ele batendo nela, mas ela contou que ele bateu`, disse uma testemunha. Liduina teria ido até a casa do filho e levado a grávida para a sua casa. ´Dez minutos depois, ele (Clebson) foi bater na porta da mãe. Ele dizia 'abra que eu quero minha mulher' e arrombou a porta, contou uma testemunha. Liduina teria saído de casa já batendo no filho, chegando a rasgar a camisa dele. Clebson não teria reagido. Ele se desvencilhou da mãe e tentou entrar. Nesse momento, Liduina estava em uma parte escura do terreno, dificultando a visualização. E Clebson, que não havia conseguido entrar, começou a gritar 'mãe me furou'.

´Ela feriu ele no pescoço e ficou segurando o ferimento. Logo depois, começou a lavar tudo. Ela lavou a roupa dela, que estava suja de sangue, tomou banho e trocou de roupa`, disse uma testemunha, consternada com o que ela chamou de ´frieza` de Liduina. De acordo com essa testemunha, os vizinhos informaram que haviam chamado o Samu, ao que a mãe teria respondido: ´não precisa chamar ambulância. (Fonte: Diário de Pernambuco – 16/11/2010).

Pois bem.

Analisando a matéria veiculada pela imprensa, logo, percebe-se que há diversas contradições apresentadas pela acusada, se não vejamos:

a) À princípio ela disse que estavam comemorando o aniversário da vítima (Clebson), mas ao ser apresentada no velório, a identidade da vítima, logo ficou constatado que essa primeira versão não resiste por muito tempo, pois ali está constatado que a data de nascimento do mesmo é: 10/01/1980;

b) A ré afirmou ainda, que se encontrava dormindo, e viu um vulto, momento em que pensou se tratar de um ladrão, pegou uma faca e efetuou golpes contra o suposto assaltante, caracterizando, assim a sua tese da legitima defesa.

c) Mas, conta a imprensa, que várias são as testemunhas que afirmam que o motivo do crime foi por motivo fútil, pois conta-se que a mãe da vítima deu guarida a sua nora, motivo que levou o Clebson a ir buscá-la de volta, arrombando a casa desta, apresentando gestos violentos, agressivos, o que levou a pessoa da ré a agir de forma fria, calculista e excessiva.

Conta-se ainda, que a ré feriu a vítima no pescoço e logo em seguida ficou segurando o ferimento, lavou a roupa dela, trocou de roupa e impediu que os vizinhos chamassem o SAMU.

Desse modo, a tese da legítima defesa cai por terra, tendo em vista os meios utilizados pela acusada, quais sejam: o excesso de golpes que efetuou, a impossibilidade de defesa da vítima, assim como a omissão de socorro, mesmo sabendo, posteriormente que a referida vítima era seu filho.

O que se verifica in casu, o possível acontecimenot do denominado erro sobre o elemento do tipo, qual seja, o erro sobre a pessoa, tipificado no Artigo 20, § 3º do Código Penal.

Como o dolo é querer a realização do tipo objetivo, quando o agente não sabe que está realizando um tipo objetivo, porque se enganou a respeito de um de seus elementos, não age dolosamente: há erro de tipo. São casos em que há tipicidade objetiva, mas não há tipicidade subjetiva por estar ausente o dolo.

O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Suponha-se que seja verdadeira a versão da ré, onde afirmou que queira matar o ladrão que invadiu a sua casa, mas confundiu este na escuridão com seu filho, e alveja este. Nesta hipótese, poderia até ser considerável legítima defesa putativa, ao invés de erro acidental e ela responde pelo homicídio porque pretendia praticar a conduta típica de matar alguém. Dispõe a lei, todavia, que na hipótese se consideram não as condições ou qualidades da vítima real, mas as da pessoa contra quem o sujeito pretendia agir.

Aqui ocorre um desvio do curso causal do agente em face do resultado. É quando um agente pretende ofender o sujeito. Na mente do agente, a vítima contra quem esfaqueou era o que ele realmente gostaria de ofender, no caso, o ladrão que ela imaginou invadir a sua casa.

Mas, acredito, que a versão apresentada neste momento pela acusada é insustentável, tendo em vista as demais provas que estão surgindo no inquérito policial, o que levará, com certeza, ao final, ao indiciamento da mesma por homicídio qualificado (doloso).
Então pergunta-se: erro acidental ou legítima defesa putativa?

Diante da versão da acusada, não acredito em nenhuma das duas hipóteses descritas acima.


É o que tem a dizer,

Eudes Borges

Nenhum comentário:

Postar um comentário