Como é cediço,
o roubo é crime doloso, acrescendo-se ao tipo subjetivo, um elemento especial
denominado de animus rem sibi habendi,
que significa subtração da coisa para si ou para outrem, complementado pelo animus domini, também chamado de
intenção de assenhoramento. Nesse tipo penal, o sujeito ativo age com o desígnio
de ter o produto do crime, integrando-o ao patrimônio próprio ou ao patrimônio
de outrem, por isso, para sua consumação não é exigida a intenção de lucro.
Mas, o amigo
leitor pode está a perguntar: e os saques ocorridos durante a greve da PMPE nos
últimos dias 14 e 15 de maio do ano em curso, como ficam? Ou seja, com essa
exigência da intenção de assenhoramento, há crime de roubo quando o agente tem
apenas a vontade de usar momentaneamente o bem subtraído, restituindo-o em
seguida, como tem noticiado à mídia televisiva?
Para Damásio
de Jesus (E. de. Direito penal, v. 2, p. 338): "não há delito de roubo
quando o sujeito não age com a finalidade de assenhoramento definitivo da coisa
móvel alheia".
Para Eudes
Borges, há sim o delito de roubo, mesmo quando o agente não age com a
finalidade de assenhoramento definitivo da coisa móvel alheia, uma vez que
caracterizado está o animus rem sibi
habendi. Em todas as situações que vimos na ocasião da greve, os meliantes
agiram em comum acordo para a prática da conduta descrita no tipo penal (roubo
ou furto).
Por isso, considero que o roubo ou furto de uso é
típico, antijurídico e culpável como qualquer outro roubo ou furto. Não importa
a intenção de o agente subtrair para ficar ou subtrair para usar; em ambas há a
criminosa subtração para si. O uso da coisa é um dos poderes inerentes à
propriedade, da qual o agente se investe, cerceando indevidamente o direito
patrimonial da vítima. A efetiva apropriação do bem pelo agente e o real uso do
mesmo, sequer são relevantes, ou seja, mesmo que o crime pudesse não estar
exaurido, já estaria consumado.
Por sua vez,
alguns operadores do Direito estão defendendo a tese do principio da bagatela
em algumas ocorrências nesse caso específico da greve da PMPE, em face da
mínima ofensividade nos casos tidos como furtos, não se aplicando, por
conseguinte, para à prática do roubo, por conta da grave ameaça.
Pois bem.
O princípio da
insignificância requer, para sua aplicação, que a mínima ofensividade da
conduta seja analisada caso a caso, observando o bem subtraído, a condição
econômica do sujeito passivo, as circunstâncias e o resultado do crime.
In casu, entendo que também não deve ser
aplicável esse princípio aos furtadores que saquearam as lojas e supermercados
durante a greve da PMPE, porque os agentes, em comunhão de desígnio, ao
ingressarem nas lojas e supermercados, romperam obstáculos durante o repouso
noturno, causaram pânico à sociedade, motivos que indicam o alto grau de
reprovabilidade de suas respectivas condutas.
Merece ser
ressaltado ainda, que a benesse prevista no Artigo 16 do Código Penal também não
se aplica aos fatos ocorridos durante a greve da PMPE, uma vez que em todos os
casos ocorreram o uso da violência ou grave ameaça à pessoa.
Diante do exposto, conclui-se que, os meliantes que
tomaram a decisão volitiva e dolosa de ingressar nos estabelecimentos
comerciais do estado de Pernambuco durante a greve da PMPE nos dias 14 e 15 de
maio do corrente, devem ser processados e punidos pela prática dos crimes de
roubo ou furto qualificado, dependendo da situação de cada um, com a aplicação
das atenuantes previstas em lei, porque, como dito acima, roubar para usar é
tão criminoso como extorquir para usar, cometer latrocínio para usar a coisa;
não importa, a punição estatal se impõe na vida de todos os delinquentes que
assim agiram.
É o que tem a dizer,
Eudes Borges