domingo, 27 de setembro de 2015

A CAVERNA DE CADA UM

Neste estudo pretendo mostrar ao amigo leitor, baseado no Livro de 1ª Reis, os dois aspectos da vida: o bom e o ruim. A caverna de cada um. O primeiro, é o natural e o mais almejado, pois viemos a esse mundo para sermos felizes e desfrutar do bom e do melhor.

Quando tudo vai bem, quando estamos felizes e bem-sucedidos, a acomodação da fé parece ser natural e há um certo relaxamento, haja vista a desnecessidade de maiores esforços. Amigos, festas, prazeres e alegrias, são os companheiros de quem está bem. É o lado bom da vida, o mais almejado por todos.

Já o segundo, é o mais indesejável, haja vista que ninguém veio o mundo para sofrer e passar por humilhações. Mas é inevitável que durante toda a nossa vida passemos pelos dois aspectos. Não adianta o amigo leitor estranhar, é a pura realidade, provaremos dos dois, não tenha dúvida.

Pois bem. O livro de 1ª Reis mostra que Elias era um grande homem de Deus e através de sua vida, o nome do Todo-Poderoso foi glorificado vária vezes. Deus falava através de Elias e com isso o povo o considerava como um verdadeiro profeta (1ª Reis, capítulo 17, versículo 24). O que ele falava acontecia (1ª Reis, capítulo 17, versículos 14 ao 16).

Já o capítulo 18, mostra o auge da vida de Elias (o lado bom). Vitorioso, mostrou o poder de Deus e venceu os profetas de Baal no monte Carmelo. Maravilhas aconteceram e Elias ia bem de vida. É o capitulo da conquista.

Ocorre que, a desgraça de Elias começa a vir no capítulo 19 (o lado ruim). A partir daí ele é ameaçado de morte por Jezabel e foge para não morrer. A situação vexatória é tão grande, que no caminho ele pede a Deus que o mate, pois não aguenta mais sofrer (1ª Reis, cap. 19, versículos 1 ao 4).

Já desfalecido, o próprio Deus manda um anjo o socorrer e o fortalecer, dizendo-lhe que a jornada seria longa (versículo 7). Com isso, ele segue viagem pelo deserto, caminhando durante 40 dias e 40 noites. Dor, sofrimento, solidão e angustia foram os companheiros dele nesse momento.

O homem de Deus que, depois de provar do lado bom da vida, passou por um momento difícil e provou do desprezo e do abandono das pessoas. A partir de então, com medo, ele resolve se esconder em uma caverna (Capítulo 19, versículo 9).

Quantas são as pessoas que quando provam do amargo da vida, resolvem se isolar e se esconder na caverna?  Só que, três fenômenos acontecem na vida de quem está na caverna: O vento, o terremoto e o fogo. O diabo aparece em forma de problemas. Foi o que aconteceu com Elias. Na caverna, o mal se levantou. Na caverna, Elias foi afrontado por um grande e forte vento, que fendiam os montes e quebrava as penhas (Capítulo 19, versículo 11).

Note que não era o vento do Espírito, pois o Senhor não estava no vento. Era o próprio diabo que apareceu soprando nos ouvidos do escolhido do Senhor. Ventos de apostasia, de acusações, de mentiras. Ventos que são soprados trazendo mensagens do tipo "você não vai conseguir", "quem é você", "com os outros acontece, menos contigo".

Esses ventos, na verdade, são lembranças do passado, acusação do passado, sentimento de solidão, de esquecimento, ventos grandes e fortes que objetivam estragar tudo aquilo que está dentro de nós. Elias provou desse vento, dentro da caverna.

Pensa que parou por aqui? Não, lógico que não! Em seguida, a Bíblia diz que lhe sobreveio um terremoto. Pois é. Elias mal saiu da afronta do vento satânico e foi vítima de um terremoto (mesmo versículo 11).

Observe que no terremoto, tudo sai do lugar, tudo parece que vai cair, o que estava arrumado vira uma bagunça, o chão parece que vai se abrir e sugar tudo, o que está em pé vai ao chão. Pois é.  Esta nova afronta tenta jogar o profeta ao chão e derrubá-lo. Elias era um homem de Deus, mas mesmo assim, não foi poupado das adversidades, do dia mal, ou seja, da caverna.

Esse é o tipo de problema que tenta fazer com que venhamos cair. O terremoto da vida tenta colocar em desordem tudo aquilo que você tem lutado com tanto esforço para arrumar e, de uma hora para outra, tudo vira uma bagunça.

Depois que toda a vida de Elias tinha sido colocada ao chão, pelo terremoto que lhe sobreveio na caverna, agora, para piorar a situação, lhe sobrevém um fogo (capítulo 19, versículo 12). Quando Elias pensava que as coisas iam melhorar, pelo contrário, aparece um fogo para piorar a situação.

É meu amigo. No fogo as coisas fogem do controle. Começa de uma pequena situação e, em pouco tempo vira algo destrutivo. Toda a vida boa de Elias foi queimada pelo fogo e virou cinzas. Antes, desfrutava das maravilhas de Deus e agora, fugitivo e morador de uma caverna, tem sua vida transformada em cinzas.

Uma coisa é certa amigo leitor. É na caverna que tudo acontece. Todo mundo um dia vai passar pela caverna e quando ela chegar, temos que estar preparados, pois é ali que Deus aparece na vida do ser humano para mostrar a saída para a situação adversa.

Lembre-se que somente há uma saída na caverna, que é o mesmo lugar por onde se entra. Que significa a volta para o lugar de origem. Foi na caverna que Deus apareceu pra Elias. Aleluia!  Depois de todas essas tribulações (vento, terremoto e fogo), veio a voz de Deus repreendendo Elias (1ª Reis, capítulo 19, versículos 13 e 15).

Pois é. Deus deu um puxão e orelha em Elias e mandou que ele deixasse de se esconder e saísse daquela caverna. O medo de Elias não foi mais forte que a resposta de Deus. Ele era um profeta, um ungido e escolhido de Deus e jamais deveria estar escondido em uma caverna.

Note que em todos os capítulos anteriores ao 19, Elias confiava na Palavra de Deus e a partir da ameaça de Jezabel, ele passou a confiar em sua própria palavra e não mais na de Deus e por isso foi se esconder em uma caverna. Aceitou aquela situação.

Isso pode acontecer com qualquer um de nós, mas existe um pequeno detalhe que talvez o amigo leitor não tenha percebido ainda. O detalhe é que a caverna que Elias se escondeu ficava localizada no Monte de Deus. É justamente no Monte Horebe que Elias foi se esconder. Não foi em qualquer lugar.

Isso tem que ficar registrado. Ele não foi para o mundo como muitos vão quando vêm as dificuldades da vida. Ele não foi para um lugar que traria desonra a Deus. Ele foi ao monte de Deus. Ele foi ao monte Sinai. Isso é muito forte amigo. Passou pela caverna, mas não saiu do monte.

Elias era um homem de Deus e mesmo passando por um momento de dor, sofrimento e de angústia, escolheu o altar para se refugiar. Estava na caverna? Sim, mas foi lá mesmo que veio a resposta de Deus, na hora certa.

Como Elias, hoje existem muitos que estão na mesma situação. Na caverna, passando por uma situação terrível, que só Deus pode resolver, mas se permanecer firme, se confiar e não abandonar o próprio ambiente religioso, com certeza a resposta divina virá e dias melhores surgirão.

Muitos têm se escondido na caverna do mundo e por isso não conseguem sair da situação adversa e não obterão a resposta de Deus, mas se você estiver passando pelos dias maus, semelhantes aos de Elias, não permita que os ventos atinjam teu coração, não caia na prova do terremoto e não seja destruído pelo fogo.

Acima de tudo, saiba que depois das provas, Deus vai te tirar dessa caverna, na hora certa e no tempo certo. Pode acreditar.

É o que tem a dizer,


Eudes Borges

domingo, 20 de setembro de 2015

CONHECENDO O PROCEDIMENTO DO PROCESSO NO TRIBUNAL

O procedimento do processo no Tribunal do Júri é bifásico ou escalonado, compreendendo uma fase preliminar, denominada de preparatória, seguida de uma fase definitiva, que é aquela em que é levado à plenário.

A fase preparatória volta-se ao julgamento da denúncia, resultando em juízo de admissibilidade da acusação. Finda-se no momento da decisão de pronúncia ou da impronúncia, ou da absolvição sumária.

Já a fase definitiva, tem por finalidade, o julgamento da causa, transferindo-se aos jurados o exame da procedência, ou improcedência da pretensão acusatória. É a fase em que o processo passa a ser apreciado pelo tribunal do júri e é levado a julgamento em plenário.

A forma inicial para o recebimento do processo cuja competência seja da vara do júri (crimes contra a vida), quais sejam: homicídio tentado ou consumado, infanticídio, aborto, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, basicamente segue o mesmo rito do procedimento comum (na fase preparatória), até o oferecimento da defesa prévia do acusado.

Pois é. O juiz recebe a denúncia, manda citar o acusado para se defender das acusações no prazo de 10 dias; este apresenta e pode arguir as preliminares em sua defesa como quiser, podendo arrolar até oito testemunhas também, mas só que a partir daqui o procedimento começa a mudar.

Diz o Artigo 409 do CPP, que apresentada a defesa preliminar do acusado, o juiz, diferente do que acontece no procedimento comum, deverá dar vista dos autos ao Ministério Público para pronunciamento, no prazo de 05 dias.

Diferentemente também do que ocorre no procedimento comum, o juiz deverá designar audiência de instrução no prazo de 10 dias, após o parecer do Ministério Público, conforme consta no Artigo 410 do CPP.

Na audiência, o rito segue o mesmo do procedimento comum, qual seja, o juiz ouve a vítima (no caso de tentativa de homicídio, é claro, porque se for homicídio consumado não poderá ser ouvida), em seguida ouvirá as testemunhas do MP e da defesa, e por fim, interrogará o acusado.

Encerrada a audiência de instrução, se não for caso de aditamento (art. 384), conforme diz o § 3º do Artigo 411, as partes apresentação alegações finais de forma oral, sendo que primeiramente o MP e depois a defesa, como requer a regra, pelo prazo de 20 minutos, prorrogável por mais 10 (se tiver assistente do MP o prazo é de 10 minutos, prorrogável por mais 10).

Verifique que diferentemente do que acontece na audiência de instrução e julgamento do procedimento comum, no procedimento do júri não tem requerimento de diligências após a audiência (nesta fase preparatória, porque na fase definitiva tem), passando-se em seguida para a fase das alegações finais, conforme dito acima.

Encerrada a instrução, o juiz deverá proferir a decisão de pronúncia, impronúncia ou absolvição sumária, na mesma audiência, ou o fará no prazo de 10 dias, conforme diz o § 9º do Artigo 411 do CPP.

Vale ainda registrar, que de acordo com o Artigo 412 do CPP, todo esse procedimento deverá ser concluído no prazo de 90 dias, mas na prática não é isso que temos visto, até porque a demanda processual é muito grande. É o fim da primeira fase.

É o que tem a relatar,


Eudes Borges

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

CONHECENDO O DIREITO PROCESSUAL PENAL



No Artigo 394 do Código de Processo Penal, o legislador definiu as regras do devido processo legal, que está compreendida em procedimento comum e especial.

O procedimento comum está subdivido em ordinário, sumário ou sumaríssimo, o qual variará de acordo com a pena prevista para cada tipo penal.

O procedimento será ordinário, quando a sanção máxima aplicável for igual ou superior a 04 anos de pena privativa de liberdade, nos termos do Inciso I, do § 1º, do Artigo 394 do CPP.

Já o procedimento terá o rito sumário, quando a pena máxima aplicável ao crime for inferior a 04 anos de privação da liberdade. Por conseguinte, o rito será sumaríssimo, para infrações consideradas de menor potencial ofensivo.

Desse modo, para que saibamos o tipo de procedimento a ser utilizado pelo julgador, deveremos saber qual o tipo de pena máxima aplicável ao caso concreto, nos termos acima descritos.

Ao concluir o inquérito policial, a autoridade policial encaminhará os autos ao magistrado, que por sua vez, os remeterá para o Ministério Público, para oferecimento da denúncia.

Assim, quando for protocolada a denúncia, o magistrado proferirá uma decisão, recebendo-a ou rejeitando-a.

Veja agora as hipóteses em que o magistrado poderá rejeitar a denúncia ou a queixa, conforme aduz o Artigo 395 do CPP:

a)                Quando ela for manifestamente inepta;
b)               Quando faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal;
c)                Faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Somente nessas hipóteses, e mediante decisão devidamente fundamentada, o juiz poderá rejeitar a denúncia.

Preenchendo os requisitos do Artigo 41 do CPP, o magistrado a receberá e estando ou não o réu preso, determinará que se proceda a citação do mesmo para responder por escrito, no prazo de 10 dias, mediante advogado, conforme consta no Artigo 396 do CPP.

Caso o réu seja devidamente citado e não apresente resposta no prazo de 10 dias, o juiz nomeará defensor público para tal finalidade, no mesmo prazo de 10 dias (§ 2º do Art. 396). Mas, se oferecer resposta, poderá alegar em forma de preliminares, tudo o que interessar em sua defesa, assim como juntar documentos, arrolar testemunhas e até pedir a absolvição sumária tipificada no Artigo 397 do CPP.

Depois de juntada aos autos a defesa preliminar do réu, o processo retorna concluso ao magistrado, que deverá proferir decisão fundamentada, nos seguintes termos:

a)                Absolver sumariamente o acusado, em sendo comprovado até aquele ato processual, algumas das hipóteses constantes no Artigo 397 do CPP (causa de excludente de ilicitude, da culpabilidade; se o fato atribuído ao réu não constitui crime ou se estiver extinta a punibilidade do agente).

b)               Não verificando algumas das hipóteses acima citadas, deverá designar audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 dias, ordenando a intimação das partes e das testemunhas, nos termos do Artigo 399 do CPP.

Nesta audiência de instrução e julgamento, o juiz deverá ouvir primeiro a vítima, em seguida as testemunhas arroladas pelo ministério público, logo após as testemunhas arroladas pela defesa, e por último deverá interrogar o acusado ou os acusados de forma separada, é claro (art. 400).

É importante esclarecer, que em homenagem ao princípio da celeridade processual e da unicidade dos atos, as provas deverão ser produzidas em uma audiência só, exceto quando não for possível, conforme regula o § 1º do Artigo 400 do CPP.

Vale ainda dizer, que tanto o ministério público quanto a defesa poderão arrolar até oito testemunhas, que deverão ser ouvidas em juízo, caso compareçam e neste número não se computam as que não prestam compromisso.

Cuida ainda esclarecer, que as partes poderão desistir de suas testemunhas, exceto as que forem arroladas pelo magistrado pelo artigo 209 do CPP. É o que diz o § 2º do Artigo 401.

Após a produção das provas em audiência, ao final, as partes poderão requerer diligências, se for importante, nos termos do Artigo 402 do CPP.

Mas, caso não sejam requeridas diligências pelas partes, ou até mesmo se o magistrado as tiver indeferido, em seguida serão dada vistas dos autos ao Ministério Público para oferecimento das alegações finais de forma oral, no prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10 minutos (se o processo contiver assistente do MP esse terá o prazo de 10 minutos, prorrogável por igual período, para apresentar as alegações finais também), e em seguida para a defesa, no mesmo prazo acima citado, conforme assegura o Artigo 403 do CPP.

Friza o Artigo 404, que se forem deferidas as diligências previstas no art. 402, a audiência se encerrará sem as alegações finais e após a realização de tais diligências, a secretaria da vara deverá abrir vista para as partes apresentarem as alegações finais em forma de memoriais (por escrito), no prazo de 05 dias e no prazo de 10 dias o juiz deverá prolatar a sentença.

A prolação da sentença, põe fim ao processo, podendo, a parte que se sentir contrariada com o veredicto, apresentar recurso no prazo de 05 dias.

É o que tem a relatar,

Eudes Borges

terça-feira, 8 de setembro de 2015

A GUERRILHA DO ARAGUAIA NUMA VISÃO SIMPLIFICADA

CAPÍTULO I
DO BREVE RELATÓRIO DO CASO CONCRETO

Durante a ditadura militar, vários partidos e organizações de esquerda optaram pelo caminho da luta armada. Tanto nas cidades como no campo, essa "oposição armada" ao regime marcou profundamente a história política recente do Brasil. No caso dos conflitos rurais, o mais importante e até hoje mais controverso foi a chamada Guerrilha do Araguaia.

Ocorrida no início da década de 1970, a guerrilha levou este nome por ter sido travada em localidades próximas ao rio Araguaia, na divisa entre os atuais estados do Pará, Maranhão e Tocantins (na época, pertencente ao Estado de Goiás). A guerrilha foi organizada pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), que, desde meados dos anos 1960, já mantinha militantes na região do conflito.

O objetivo do PC do B era angariar apoio da população local para, a partir do campo, enfrentar a ditadura, derrubá-la, tomar o Estado e fazer a revolução. Antes de definir-se pela luta armada, o partido apostou na estratégia de construção de uma frente ampla democrática contra a ditadura. Essa linha política, entretanto, não eliminou a opção armada.

Com a decretação do AI-5, no final de 1968, e o endurecimento do regime militar, o PC do B abandonou definitivamente a luta democrática em favor do enfrentamento armado. O mesmo caminho foi feito por outros partidos e organizações, que, nas cidades, deram início a uma onda de atentados e expropriações. O PC do B, ao contrário, praticamente não se envolveu em ações urbanas. Isso, de certa forma, preservou-lhe da perseguição da ditadura, garantindo melhores condições para estruturar a guerrilha no campo.

Embora, até então, as ações armadas mais espetaculares tivessem ocorrido nas cidades, parte da esquerda revolucionária acreditava que a guerrilha rural também era um passo decisivo rumo à revolução.

Com uma estratégia que mesclava as experiências chinesa e cubana, o PC do B acreditava que a deflagração da guerrilha representaria uma inflexão na oposição à ditadura. Tanto é assim que, no começo de 1972, em meio ao endurecimento do regime e à crescente perseguição nas cidades, o partido enviou para a região do Araguaia boa parte dos membros do seu Comitê Central.

Para a estruturação da guerrilha, foi criado uma Comissão Militar, à qual competia coordenar três agrupamentos menores, formados por 21 militantes - cada um com seu respectivo comandante. Os agrupamentos, por sua vez, subdividiam-se em três destacamentos menores, de 7 militantes cada, incluindo um chefe e um subchefe para cada grupo. Era, portanto, uma estrutura rígida, que visava não apenas organizar os trabalhos no campo como também proteger-se da perseguição militar.

A divisão dos guerrilheiros em uma estrutura de grupos e subgrupos fez com que nem mesmo entre eles um destacamento conhecesse os integrantes dos outros. Essa divisão em "células" e a utilização de nomes frios era uma estratégia para que, em caso de captura, um militante não delatasse os demais, o que faria cair a estrutura inteira.

O CONFRONTO COM O EXÉRCITO

A versão mais aceita dá conta de que a guerrilha, ainda não deflagrada, teria sido descoberta pelos militares através de informações passadas por uma militante do PC do B. Foi assim que, em abril de 1972, o Exército chegou à região à procura dos guerrilheiros, que viviam misturados à população local.

Naquele momento, praticamente 70 militantes do partido moravam na região, trabalhando como agricultores, farmacêuticos, professores e comerciantes. Para não chamar a atenção, o grupo não se envolvia com questões políticas. Por isso, dada a sua integração, foi com grande surpresa que a população local recebeu a notícia de que eram acusados de atividade subversiva.

Apesar de serem infinitamente mais fracos que o Exército, os guerrilheiros conseguiram resistir por quase dois anos às perseguições. Os militares precisaram de três campanhas para, finalmente, encerrar o conflito na região do Araguaia, em dezembro de 1973, com a destruição da Comissão Militar. Daí em diante, as perseguições continuaram, mas a estrutura da guerrilha já estava completamente desmantelada.

Àquela altura, as bases do PC do B nas cidades também tinham sido duramente perseguidas, de forma que o partido perdeu quase que por completo o contato com os guerilheiros estabelecidos no Araguaia, literalmente isolados no meio da selva. As investidas militares, inclusive contra os moradores - foram marcadas pela extrema crueldade, tendo se transformado, sobretudo na fase final da guerrilha, numa verdadeira caça aos comunistas.

O FIM TRÁGIDO

O conflito do Araguaia terminou com um trágico saldo: foram cerca de 76 mortos, sendo 59 militantes do PC do B e 17 recrutados na região. Também por isso, acabou se transformando no principal confronto direto entre a ditadura militar e a esquerda armada. Ocorrida sob intensa censura, a guerrilha nem mesmo chegou ao conhecimento da população em geral, o que só ajudou a isolar ainda mais os militantes do PC do B.

A confirmação da existência da guerrilha na região por parte do governo só veio tempos depois de encerrado o conflito. A perseguição aos guerrilheiros, segundo testemunhos de militares que participaram da operação, moradores do local e sobreviventes, teve requintes de crueldade, como decapitação e fuzilamento.

Em razão disso, muitos corpos nunca foram encontrados. Desde os anos 1980, os familiares dos guerrilheiros mortos vêm lutando, inclusive na Justiça, para que o Exército libere documentos que comprovem a morte dos parentes. Os militares, porém, continuam negando a existência de quaisquer documentos, o que já foi amplamente contestado.

CAPÍTULO II
DAS AÇÕES JUDICIAIS INTERNAS INGRESSADAS

Diante desse episódio nefasto que manchou a história do Brasil, em 19 de fevereiro de 1982, 22 familiares de 25 desaparecidos da Guerrilha iniciaram uma ação judicial de natureza civil contra o Estado Federal, perante a Primeira Vara Federal do Distrito Federal, a qual foi distribuída sob o nº 82.00.24682-5, solicitando informação à União sobre a sepultura de seus familiares, de maneira que se pudessem emitir os certificados de óbito, realizar o traslado dos restos mortais.

Pois é. O principal objetivo dessa ação era que as autoridades a quem era dirigida procedessem à desclassificação de documentos sigilosos, que interessavam aos familiares dos mortos e desaparecidos políticos para conhecer a verdade e localizar os restos mortais de seus entes queridos, bem como possibilitar ao Ministério Público Federal o acesso a seu conteúdo para promover as medidas que, todavia, fossem possíveis para responsabilizar os violadores de direitos humanos durante a ditadura milita.

Somente em junho de 2003, a Primeira Vara Federal finalmente analisou o mérito do caso e julgou procedente a ação.

 Por conseguinte, ordenou a desclassificação e apresentação de toda a informação relativa às operações militares relacionadas à Guerrilha do Araguaia e que se informasse sobre o local de sepultamento dos desaparecidos, entre outras medidas.

 Em agosto de 2003, a União apelou dessa sentença. A apelação foi recusada pelo Tribunal Regional Federal, em dezembro de 2004.

Posteriormente, em 8 de julho de 2005, o Estado interpôs um Recurso Especial e um Recurso Extraordinário. O primeiro foi declarado parcialmente procedente pelo Superior Tribunal de Justiça, no que concerne à determinação do órgão judicial executor da sentença de primeira instância e o segundo não foi admitido pelo Tribunal Regional Federal.

Em 9 de outubro de 2007, essa decisão transitou em julgado. Em maio de 2008, o expediente foi reenviado à Primeira Vara Federal para iniciar a execução da sentença, a qual foi ordenada em 12 de março de 2009.

Nesta data, em consulta ao sítio eletrônico da Justiça Federal (http://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?proc=8200246825&secao=DF&enviar=Pesquisar), observa-se que os presentes autos ainda se encontram em tramitação(Com a Diretoria)

DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA

Mediante solicitação dos familiares, em 2001, as Procuradorias da República dos estados do Pará e de São Paulo e do Distrito Federal iniciaram os Inquéritos Civis Públicos No. 1/2001, 3/2001 e 5/2001, respectivamente, com a finalidade de compilar informações sobre a Guerrilha do Araguaia. Os promotores elaboraram, em janeiro de 2002, um “Relatório Parcial de Investigação sobre a Guerrilha do Araguaia”.

Como consequência dessas investigações, em 9 de agosto de 2001, o Ministério Público Federal interpôs a Ação Civil Pública No. 2001.39.01.000810-5 contra a União, com o propósito de fazer cessar a influência, através de assistência social, das Forças Armadas sobre os habitantes da região do Araguaia, bem como obter da União todos os documentos que contivessem informação sobre as ações militares de combate à Guerrilha.

 Em 19 de dezembro de 2005, a Primeira Vara Federal declarou parcialmente procedente a ação.

Após a interposição de um recurso por parte da União em março de 2006, a sentença de primeira instância foi parcialmente reformada, mediante decisão de 26 de julho de 2006, em razão do que se manteve somente a obrigação de exibir, reservadamente, todos os documentos que contivessem informação sobre as ações militares contra a Guerrilha.

Em setembro de 2006, a União interpôs um Recurso Especial e um Recurso Extraordinário contra essa última sentença.

O Recurso Especial não foi admitido pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme decisão de 18 de agosto de 2009.

Logo da não admissão do Recurso Extraordinário pelo Tribunal Regional Federal, a União interpôs um Agravo de Instrumento perante o Supremo Tribunal Federal.

 No marco deste recurso, em 7 de dezembro de 2009, a União solicitou que se declare a perda de seu objeto, dado que o pedido de exibição de documentos relativos à Guerrilha do Araguaia feito na Ação Civil Pública No. 2001.39.01.000810-5 já fora atendido no julgamento da Ação Ordinária No. 82.00.24682-5, a qual adquiriu força de coisa julgada.

Por outra parte, em 19 de dezembro de 2005, o Ministério Público Federal e a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos do Instituto de Estudos da Violência do Estado, apresentaram uma petição de Notificação Judicial ao Presidente da República, ao Vice-Presidente e a outros altos funcionários do governo e das Forças Armadas, em relação à desclassificação de documentos sigilosos que interessem aos familiares de mortos e desaparecidos políticos para fins de conhecer a verdade e de localizar os restos mortais de seus entes queridos, bem como de possibilitar ao Ministério Público Federal o acesso a seu conteúdo.

CAPÍTUILO III
DA AÇÃO INTERNACIONAL INTENTADA PERANTE A OEA

Em abril de 2009, a comissão Interamericana de D. humanos (CIDH), órgão da organização (OEA) que cuida da observância dos Direitos Humanos nos países pertencentes à organização, abriu uma ação contra o governo brasileiro por detenção arbitraria, Tortura e desaparecimento de 70 pessoas entre Guerrilheiros, moradores da região e camponeses ligados à Guerrilha do Araguaia durante a ditadura militar brasileira.

Com esta ação internacional, os representantes solicitaram ao Tribunal que ordene ao Brasil a investigação dos fatos, o julgamento e a punição de todos os responsáveis, em um prazo razoável, e que disponha que o Estado não pode utilizar disposições de direito interno, como prescrição, coisa julgada, irretroatividade da lei penal e ne bis in idem, nem qualquer excludente de responsabilidade similar, para eximir-se de seu dever. O Estado deve remover todos os obstáculos de facto e de iure, que mantenham a impunidade dos fatos, como aqueles relativos à Lei de Anistia. Adicionalmente, solicitaram à Corte que ordene ao Estado que: a) sejam julgados na justiça ordinária todos os processos que se refiram a graves violações de direitos humanos; b) os familiares das vítimas tenham pleno acesso e legitimação para atuar em todas as etapas processuais, em conformidade com as leis internas e a Convenção Americana, e c) os resultados das investigações sejam divulgados pública e amplamente, para que a sociedade brasileira os conheça.

Em 14 de dezembro de 2010, o Brasil foi condenado pela CIDH por violação ao direito ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade, à liberdade, às garantias e proteção judiciais, à liberdade de pensamento e expressão, em razão da detenção arbitrária, tortura e desaparecimento de 70 membros do Partido Comunista do Brasil e de camponeses da região do Araguaia no período de 1972 a 1975. Em decorrência dessa responsabilização, a Corte condenou o Estado brasileiro a reparar as vítimas diretas e a sociedade em geral por meio da investigação penal e da aplicação das sanções aos indivíduos responsáveis pelos crimes, da localização do paradeiro dos restos mortais dos desaparecidos e da revelação de toda a verdade relativa ao caso, do oferecimento de assistência médica e psicológica aos familiares, da realização de um ato público de reconhecimento de sua responsabilidade internacional, da capacitação de sua Força Armada acerca dos direitos humanos e da tipificação do desaparecimento forçado de pessoas como crime em sua legislação penal.

Para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Brasil, como signatário do Pacto de São José da Costa Rica (tratado que instituiu a CIDH), deveria respeitar as normas da CIDH, que prevêem a garantia dos direitos humanos, e adaptar a Constituição nacional para respeitar os textos aceitos internacionalmente.

CAPÍTULO IV
DAS VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS OCORRRIDAS NO EVENTO

Com estas atitudes, incorreu o Brasil, nas violações fundamentais dos direitos humanos, em face das torturas psicológica e físicas; o direito à vida, à liberdade de pensamento e de expressão, que lhes foram destituídas através do regime militar em comento.

Violações estas referentes ao Artigo 5º e incisos da atual Constituição da República, assim como ao Código Penal pátrio.

Mas, o intento maior dos peticionários da ação, foi fundada no direito ao acesso à informação.

O direito de acesso à informação está previsto no artigo 5º da Constituição Federal de 1988 e regulamentado, inter alia, pelos seguintes decretos e leis: a) Lei No. 8.159, de 1991, que regulamenta a política nacional de arquivos públicos e privados, o acesso e o sigilo de documentos públicos, entre outras providências; b) Decreto No. 2.134, de 1997, que regulamenta o artigo 23 da Lei No. 8.159 sobre a categoria dos documentos públicos secretos.

Além do direito da proteção da família consagrado na no Artigo 226 da constituição.

DAS INFRINGÊNCIIAS AO DIREITO INTERNACIONAL

Diante do exposto, verificou-se com o intento da ação internacional, as infringências dos Artigos 1.1; 2, 8, 13 e 25 da Convenção Americana.

Pois é. Com base no retardo injustificado e na ineficácia das ações de natureza não penal interpostas, a Comissão solicitou à Corte que determine que o Estado incorreu em violação dos artigos 8 e 25 da Convenção, em concordância com o artigo 1.1 do mesmo instrumento, em prejuízo das vítimas desaparecidas e de seus familiares, assim como dos familiares da pessoa executada.

CAPÍTULO V
DA DEFESA DO ESTADO BRASILEIRO PERANTE À CORTE INTERNACIONAL

Perante á Corte Internacional, defendeu-se o Estado Brasileiro, em 9 de abril de 1999, por meio da Advocacia-Geral da União, apresentando um escrito no qual indicou que, como consequência de uma nova orientação empreendida a partir da consolidação do regime democrático, havia sido promulgada a Lei No. 9.140/95, a qual reconheceu como mortas as pessoas desaparecidas no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979 e criou a Comissão Especial que tinha, entre outras funções, a de realizar todos os esforços para localizar os corpos das pessoas desaparecidas. Indicou, ademais, que “restando comprovados […] os esforços empreendidos pelo Governo Federal, através da Comissão Especial […], não se concebe como plausível a existência de qualquer motivo para que a União, caso dispusesse realmente das informações necessárias à localização das sepulturas, se omitisse diante de um direito natural e inquestionável dos autores”. Igualmente considerou que “não havendo qualquer mínima prova razoável da existência de um suposto relatório da Guerrilha do Araguaia”, apresenta-se a União absolutamente impossibilitada de atender ao respeitável despacho […] que solicitou o encaminhamento do mencionado documento, que […] não se sabe, nem mesmo, se um dia chegou realmente a existir”. Concluiu que não se justificava a Ação Ordinária interposta, já que as pretensões dos autores haviam sido atendidas com o reconhecimento das mortes e a consequente emissão dos certificados de óbito, com base na Lei No. 9.140/95, e que a única prestação específica que permaneceria pendente, a localização das sepulturas, seria materialmente impossível em vista dos trabalhos realizados no marco da referida lei.

O Estado informou que, até 2006, foram realizadas 13 expedições à região do Araguaia, com o intuito de localizar os corpos dos guerrilheiros desaparecidos, algumas por seus familiares e outras por órgãos públicos. Além disso, prosseguem as investigações sobre a possível “Operação Limpeza”, em que, por ocasião do final da Guerrilha do Araguaia, os militares supostamente haviam retirado da área todos os restos mortais dos guerrilheiros para posterior incineração. Em particular, sobre o Grupo de Trabalho Tocantins, o Estado salientou que foi criado com a finalidade de coordenar e executar as atividades necessárias à localização, reconhecimento e identificação dos corpos dos guerrilheiros e dos militares mortos durante a Guerrilha do Araguaia e posteriormente foi criado o Comitê Interinstitucional de Supervisão do Grupo de Trabalho Tocantins, cujas atividades vêm sendo acompanhadas pelas autoridades judiciais, e contam com a participação do Ministério Público Federal.

Além disso, ressaltou que foi criada uma equipe de entrevistas e contextualização de fatos, constituída exclusivamente por civis, para entrevistar a população local e recolher novos dados sobre eventuais locais de sepultamento. Por outro lado, o Brasil informou que foi criado, em 2006, um banco de amostras de DNA dos familiares das vítimas, para facilitar a identificação dos restos mortais que sejam encontrados, o qual dispõe de amostras de 142 familiares de 108 desaparecidos políticos. Embora se tenha tentado utilizar a tecnologia e os recursos disponíveis para obter a identificação dos restos mortais, em alguns casos os resultados não foram conclusivos, em virtude das más condições dos restos encontrados e à deficiente tecnologia disponível no momento em que foram encontrados, mas prossegue o trabalho para identificá-los, valendo-se, para esse efeito, de novas técnicas e do auxílio de diferentes instituições.

Defendeu-se ainda o Estado Brasileiro, afirmando que reconheceu oficialmente sua responsabilidade pelas mortes e desaparecimentos forçados ocorridos durante o período do regime militar, inter alia, por meio da Lei No. 9.140/95 e do relatório “Direito à Memória e à Verdade” da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o qual foi apresentado em um ato público com a presença do Presidente da República, de diversas autoridades e de familiares das vítimas do regime militar. Também o Ministro da Justiça, em nome do Estado, realizou um pedido oficial de desculpas mediante um ato público realizado em 18 de junho de 2009, em que foram concedidos os benefícios de uma anistia política a 44 camponeses da região, os quais foram perseguidos para prestar informações sobre a Guerrilha do Araguaia. Adicionalmente, promoveu ainda outras medidas de caráter imaterial. Quanto ao projeto “Direito à Memória e à Verdade”, conduzido pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, salientou que compreende várias ações: a) a publicação e distribuição do relatório Direito à Memória e à Verdade em escolas públicas; b) outras três publicações a fim de ressaltar aspectos relevantes da luta contra o regime militar.

CAPÍTULO VI
DAS DETERMINAÇÕES EMITITIDAS PELA CORTE INTERNACIONAL NO JULGAMENTO DO PRESENTE CASO – CONDENAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, integrante da OEA (Organização dos Estados Americanos), condenou a repressão e os crimes cometidos pelo regime militar brasileiro durante a guerrilha do Araguaia. De acordo com sentença, que foi divulgada em 14/12/2010, o Estado brasileiro é responsável pelo desaparecimento forçado de 62 pessoas, entre os anos de 1972 e 1974.

Esta é a primeira condenação internacional do Brasil em um caso envolvendo a ditadura militar (1964-1985).

Para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Brasil, como signatário do Pacto de São José da Costa Rica (tratado que instituiu a CIDH), deveria respeitar as normas da CIDH, que prevêem a garantia dos direitos humanos, e adaptar a Constituição nacional para respeitar os textos aceitos internacionalmente.

Ficou reconhecido perante a corte internacional, através da presente sentença, que a violação do direito à integridade pessoal dos mencionados familiares das vítimas verificou-se em virtude do impacto provocado neles e no seio familiar, em função do desaparecimento forçado de seus entes queridos, da falta de esclarecimento das circunstâncias de sua morte, do desconhecimento de seu paradeiro final e da impossibilidade de dar a seus restos o devido sepultamento. A esse respeito, o perito Endo indicou que “uma das situações que condensa grande parte do sofrimento de décadas é a ausência de sepultamento, o desaparecimento dos corpos e a indisposição dos governos sucessivos na busca dos restos mortais dos de seus familiares”, o que “perpetua a lembrança do desaparecido e dificulta o desligamento psíquico entre ele e os familiares que ainda vivem”, impedindo o encerramento de um ciclo.

A esse respeito, a Corte lembrou que, conforme sua jurisprudência, a privação do acesso à verdade dos fatos sobre o destino de um desaparecido constitui uma forma de tratamento cruel e desumano para os familiares próximos.

Adicionalmente, a Corte considerou que a violação do direito à integridade dos familiares das vítimas se deve também à falta de investigações efetivas para o esclarecimento dos fatos, à falta de iniciativas para sancionar os responsáveis, à falta de informação a respeito dos fatos e, em geral, a respeito da impunidade em que permanece o caso, que neles provocou sentimentos de frustração, impotência e angústia. Em particular, em casos que envolvem o desaparecimento forçado de pessoas, é possível entender que a violação do direito à integridade psíquica e moral dos familiares da vítima é consequência direta desse fenômeno que lhes causa um grave sofrimento, o qual pode aumentar, entre outros fatores, em razão da constante negativa por parte das autoridades estatais de prestar informação acerca do paradeiro das vítimas ou de iniciar uma investigação eficaz para lograr o esclarecimento do ocorrido.

No Capítulo VIII da presente Sentença, a Corte declarou a violação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial, em virtude da falta de investigação, julgamento e eventual sanção dos responsáveis pelos fatos do presente caso. Tomando em consideração o anteriormente exposto, bem como sua jurisprudência, o referido tribunal depôs que o Estado brasileiro deve conduzir eficazmente a investigação penal dos fatos do presente caso, a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei disponha. Essa obrigação deve ser cumprida em um prazo razoável, considerando os critérios determinados para investigações nesse tipo de caso.

Determinou ainda a corte, que o Estado deve garantir que as causas penais que tenham origem nos fatos do presente caso, contra supostos responsáveis que sejam ou tenham sido funcionários militares, sejam examinadas na jurisdição ordinária, e não no foro militar.

Diante disso, decidiu a corte que o Estado brasileiro deve assegurar o pleno acesso e capacidade de ação dos familiares das vítimas em todas as etapas da investigação e do julgamento dos responsáveis, de acordo com a lei interna e as normas da Convenção Americana. Além disso, os resultados dos respectivos processos deverão ser publicamente divulgados, para que a sociedade brasileira conheça os fatos objeto do presente caso, bem como aqueles que por eles são responsáveis.

DETERMINAÇÃO DO PARADEIRO DAS VÍTIMAS

De acordo com julgados daquela corte internacional, estabeleceu-se ainda o direito dos familiares das vítimas de identificar o paradeiro dos desaparecidos e, se for o caso, saber onde se encontram seus restos, pois constitui uma medida de reparação e, portanto, gera o dever correspondente, para o Estado, de atender a essa expectativa. Receber os corpos das pessoas desaparecidas é de suma importância para seus familiares, já que lhes permite sepultá-los de acordo com suas crenças, bem como encerrar o processo de luto vivido ao longo desses anos. O Tribunal considerou, ademais, que o local em que os restos sejam encontrados pode oferecer informação valiosa sobre os autores das violações ou a instituição a que pertenciam.

DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR

A Corte julgou que as reparações econômicas concedidas no direito interno “a título de reparação” pelos desaparecimentos forçados são adequadas no presente caso. Por esse motivo, não ordenará o pagamento de somas adicionais a título de dano imaterial sofrido pelas vítimas de desaparecimento forçado. Por outro lado, com relação ao dano imaterial sofrido pelos familiares das vítimas desaparecidas, o Tribunal lembra que a jurisprudência internacional estabeleceu que, de acordo com as circunstâncias do caso sub judice, os sofrimentos que as violações cometidas causaram a esses familiares, a impunidade imperante no caso, bem como a mudança nas condições de vida e as demais consequências de ordem imaterial ou não pecuniária que estas últimas sofreram, a Corte julga pertinente fixar uma quantia, em equidade, como compensação a título de danos imateriais para os familiares indicados como vítimas no presente caso.

 Em atenção a sua jurisprudência, em consideração às circunstâncias do presente caso, às violações cometidas, aos sofrimentos ocasionados e ao tratamento que receberam, ao tempo transcorrido, à denegação de justiça e de informação, bem como às mudanças nas condições de vida e às demais consequências de ordem imaterial que sofreram, o Tribunal fixou o montante de US$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil dólares dos Estados Unidos da América) para cada familiar direto e de US$ 15.000,00 (quinze mil dólares dos Estados Unidos da América) para cada familiar não direto, considerados vítimas no presente caso e indicados no parágrafo 251 da referida Sentença. As indenizações ordenadas na aludida Sentença não obstaculizarão outras reparações que, eventualmente, possam ordenar-se no direito interno.

Definiu ainda a corte internacional, que O Estado deverá efetuar o pagamento das indenizações a título de dano material, dano imaterial e por restituição de custas e gastos estabelecidos na sentença diretamente às pessoas e organizações nela indicadas, no prazo de um ano, contado a partir da notificação da presente Sentença, nos termos dos parágrafos seguintes.

O Estado deve cumprir as obrigações monetárias, mediante o pagamento em dólares dos Estados Unidos da América, ou o equivalente em moeda brasileira, utilizando, para o cálculo respectivo, o tipo de câmbio que esteja vigente na bolsa de Nova York, no dia anterior ao pagamento.

Se, por causas atribuíveis aos beneficiários das indenizações ou aos herdeiros, não for possível o pagamento dos montantes determinados no prazo indicado, o Estado destinará esses montantes a seu favor, em conta ou certificado de depósito em uma instituição financeira brasileira solvente, em dólares dos Estados Unidos da América, nas condições financeiras mais favoráveis permitidas pela legislação e pela prática bancária. Caso a indenização de que se trate não seja reclamada no transcurso de dez anos, os montantes serão devolvidos ao Estado com os juros devidos.

Determinou ainda a corte que, caso o Estado incorra em mora, deverá pagar juros sobre o montante devido, correspondentes aos juros bancários de mora no Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, verificou-se ao longo do presente trabalho, que apesar de o Partido dos Trabalhadores estar no poder interno do Estado brasileiro, e por ter sido este também perseguido na ocasião da ditadura militar, observa-se que poucas foram as atitudes tomadas com o fito de fazer garantir os direitos fundamentais daqueles que foram massacrados pelo regime ditatório.

Foi necessária a busca ao apoio dos órgãos internacionais, para que os familiares das 72 vítimas desaparecidas, ora vítimas de crimes lesa-humanidade, tivessem êxito em ter o direito a informação acerca dos restos mortais de seus entes queridos, assim como a obter uma indenização pela atrocidade supostamente praticada pelos militares que dispunham do poder naquela ocasião.

Atualmente a sociedade mundial não mais admite tais práticas desumanas, que venham por em risco à vida, à liberdade de pensamento e de expressão, à integridade, à liberdade individual e as garantias e proteção judiciais do ser humano.

Com esta condenação, espera-se que o Estado brasileiro não mais incorra nos erros praticados no passado, mas que a partir de então, valorize, acima de tudo, um dos maiores princípios fundamentais constitucionais, assegurados no Artigo 1º, Inciso III da Constituição da República Federativa do Brasil, que é o da dignidade da pessoa humana.

É o que tem a dizer,


Eudes Borges